Airton Luiz Mendonça (Artigo do jornal O Estado de São Paulo) 

O cérebro humano mede o tempo por meio da observação dos movimentos. Se
alguém colocar você dentro de uma sala branca vazia, sem nenhuma mobília,
sem portas ou janelas, sem relógio… você começará a perder a noção do
tempo. Por alguns dias, sua mente detectará a passagem do tempo sentindo as
reações internas do seu corpo, incluindo os batimentos cardíacos, ciclos de
sono, fome, sede e pressão sanguínea. Então… Quando tempo suficiente
houver passado, você perderá completamente a noção das horas, dos dias… ou
anos. Estou exagerando para efeito didático, mas em essência é o que
ocorreria.

Isso acontece porque nossa noção de passagem do tempo deriva do movimento
dos objetos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos,
como o nascer e o pôr do sol. Se alguém tirar estes sinais sensoriais da
nossa vida, simplesmente perdemos a noção da passagem do tempo.

Compreendido este ponto, há outra coisa que você tem que considerar: nosso
cérebro é extremamente otimizado. Ele evita fazer duas vezes o mesmo
trabalho. Um adulto médio tem entre 40 e 60 mil pensamentos por dia.
Qualquer um de nós ficaria louco se o cérebro tivesse que processar
conscientemente tal quantidade. Por isso, a maior parte destes pensamentos é
automatizada e não aparece no índice de eventos do dia. Para que não
fiquemos loucos, o cérebro faz parecer que nós não vimos, não sentimos e não
vivenciamos aqueles pensamentos automáticos, repetidos, iguais.

Por isso, quando você vive uma experiência pela primeira vez, ele dedica
muitos recursos para compreender o que está acontecendo. É quando você se
sente mais vivo. Conforme a mesma experiência vai se repetindo, ele vai
simplesmente colocando suas reações no modo automático e “apagando” as
experiências duplicadas.

Se você entendeu estes dois pontos, já vai compreender porque parece que o
tempo acelera, quando ficamos mais velhos e porque os Natais chegam cada vez
mais rapidamente. Quando começamos a dirigir, tudo parece muito complicado,
o câmbio, os espelhos, os outros veículos… nossa atenção parece ser
requisitada ao máximo. Então, um dia dirigimos trocando de marcha, olhando
os semáforos, lendo os sinais ou até falando ao celular (proibido no
Brasil), ao mesmo tempo. E você usa apenas uma pequena “área” da atenção
para isso.

Como acontece? Simples: o cérebro já sabe o que está escrito nas placas
(você não lê com os olhos, mas com a imagem anterior, na mente); O cérebro
já sabe qual marcha trocar (ele simplesmente pega suas experiências passadas
e usa, no lugar de repetir realmente a experiência). Em outras palavras,
você não vivenciou aquela experiência, pelo menos para a mente. Aqueles
críticos segundos de troca de marcha, leitura de placa… São apagados de
sua noção de passagem do tempo… Porque estou explicando isso? Que relação
tem isso com a aparente aceleração do tempo? Tudo.

A primeira vez que isso me ocorreu foi quando passei três meses nas
florestas de New Hampshire, Estados Unidos, morando em uma cabana. Era tudo
tão diferente, as pessoas, a paisagem, a língua, que eu tinha dores de
cabeça sempre que viajava em uma estrada, porque meu cérebro ficava lendo
todas as placas (eu lia mesmo, pois era tudo novidade, para mim). Foram
somente três meses, mas ao final do segundo mês eu já me sentia como se
estivesse há um ano longe do Brasil. Foi quando comecei a pesquisar a razão
dessa diferença de percepção.

Bastou eu voltar ao Brasil e o tempo voltou a “acelerar”. Pelo menos, assim
parecia. Veja, quando você começa a repetir algo exatamente igual, a mente
apaga a experiência repetida. Conforme envelhecemos, as coisas começam a se
repetir — as mesmas ruas, pessoas, problemas, desafios, programas de
televisão, reclamações… enfim… as experiências novas (aquelas que fazem
a mente parar e pensar de verdade, fazendo com que seu dia pareça ter sido
longo e cheio de novidades), vão diminuindo. Até que tanta coisa se repete
que fica difícil dizer o que tivemos de novidade na semana, no ano ou, para
algumas pessoas, na década.

Em outras palavras, o que faz o tempo parecer que acelera é a…
r-o-t-i-n-a.

Não me entenda mal. A rotina é essencial para a vida e otimiza muita coisa,
mas a maioria das pessoas ama tanto a rotina que, ao longo da vida, seu
diário acaba sendo um livro de um só capítulo, repetido todos os anos.

O ANTÍDOTO PARA A ACELERAÇÃO DO TEMPO: “M &M”

Felizmente há um antídoto: Mude e Marque. Mude, fazendo algo diferente e
marque, fazendo um ritual, uma festa ou registros com fotos. Mude de
paisagem, tire férias com a família (sugiro que você tire férias sempre e,
preferencialmente, para um lugar quente, um ano, e frio no seguinte) e
marque com fotos, cartões postais e cartas. Tenha filhos (eles destroem a
rotina) e sempre faça festas de aniversário para eles, e para você (marcando
o evento e diferenciando o dia); Use e abuse dos rituais para tornar
momentos especiais diferentes de momentos usuais. Faça festas de noivado,
casamento, 15 anos, bodas disso ou daquilo, bota-foras, participe da
formatura de sua turma, visite parentes distantes, vá a uma final de
campeonato, entre na universidade com 60 anos, troque a cor do cabelo, deixe
a barba, tire a barba, compre enfeites diferentes no Natal, ou faça os
enfeites com frutas da região e a participação das crianças, vá a shows,
cozinhe uma receita nova, tirada de um livro novo. Escolha roupas
diferentes, não pinte a casa da mesma cor — faça diferente. Beije diferente
sua paixão e viva com ela momentos diferentes. Vá a mercados diferentes,
leia livros diferentes, busque experiências diferentes. Seja diferente.

Se você tiver dinheiro, especialmente se já estiver aposentado, vá com seu
marido, esposa ou amigos para outras cidades ou países, veja outras
culturas, visite museus estranhos, deguste pratos esquisitos… em outras
palavras… V-I-V-A. Porque se você viver intensamente as diferenças, o
tempo vai parecer mais longo. E se tiver a sorte de estar casado(a) com
alguém disposto(a) a viver e buscar coisas diferentes, seu livro será muito
mais longo, muito mais interessante e muito mais v-i-v-o… do que a maioria
dos livros da vida que existem por aí. Se você não tiver mais a esposa,ou o
marido, cerque-se de amigos. Amigos com gostos diferentes, vindos de lugares
diferentes, com religiões diferentes e que gostam de comidas diferentes.
Enfim, acho que você já entendeu o recado, não é? Boa sorte em suas
experiências para expandir seu tempo, com qualidade, emoção, rituais e vida.